17/07/2011

SETE PECADOS CAPITAIS: SOBERBA

“Pecados e pecadilhos” já publicados
03.05.2011 - Inveja
20.02.2011 – Luxúria
16.01.2011 – Preguiça
03.01.2011 – Avareza
26.12.2010 – Gula (nesta crônica foram dadas explicações e informações da origem dos "sete pecados capitais"

SOBERBA



A palavra “soberba” tem significado que pode conter um sentido enfático, de realce: aquela obra é soberba; aquele edifício é soberbo.
Como Machado de Assis no seu “Quincas Borba”:
“E depois o noivo é rico...”Rubião pensou na carruagem e nos cavalos que levaria, tinha visto uma parelha soberba no Engenho Velho, dias antes...”

Mas não é essa “soberba” a inserida nos “pecados capitais”.
Ela se refere àqueles desvios de personalidade que fazem acreditar a muitos indivíduos, geralmente com alguma forma de poder, o centro do mundo e agem como se fossem imortais, não só pelos seus atos mas pelo modo como pensam e pela possibilidade de convencer incautos. Aquele orgulho...soberbo.
Nestes tempos inglórios e em todos os tempos essas figuras se sobressaem às vezes incompreensíveis pelo que fazem e pelos restos desgraçados que deixam pelo mundo por anos, décadas.
É, pois, no mundo político em que a soberba extrema se mistura com a arrogância e com isso a perda dos escrúpulos mínimos. Que o digam os ditadores que se prendem ao poder como se, naquela linha de esquecerem a mortalidade, e para não descerem desses degraus os deles não cair, sacrificam opositores e inocentes.
Tudo pelo poder e para isso, os fins justificam os meios. Promovam-se guerras e guerrilhas, derrubem aviões e edifícios. Explodam-se bombas no meio da multidão desavisada. Afinal, o poder assim exige e “a minha vontade, em seu nome, haverá que prevalecer”.
Não são batalhas para mudar o que está mal, dentro daquele princípio de que uma revolução se faz necessária para minorar o sofrimento dos mais humildes, mas para se manter o poder. Ou tomá-lo para pouco ou nada mudar. O ruim substituído pelo pior!

Nessa corja de estúpidos se inscrevem os corruptos que não se prestam a questionar de onde vem o produto de seu roubo, sejam obras inacabadas de pequenas casas aos mais pobres, alimentos às crianças em escolas humildes e sacrificadas. Da infelicidade daqueles que os recursos que subtraem poderiam minorar. O que importa são os valores vultosos sempre maiores que não os satisfazem. Não há limites para o corrupto de todos os matizes, porque são os eleitos da “imortalidade”.


Se considero a preguiça moderada um pecadilho, a soberba é o pior dos pecados porque ela tende a cegar, sucumbindo a consciência e os escrúpulos. Ora, os escrúpulos são para os fracos...
Dentro do possível não dei conotação religiosa nesta série de “pecados”, mas cai bem aqui Provérbios 16:18
“A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito precede a queda.”


Na minha vida profissional, me deparei com muitos desses espécimes. Na empresa tudo gira em torno de suas idéias, são autoritários, improdutivos e afetam o ambiente de trabalho. Confundem autoritarismo com autoridade. Não se dão conta de que autoridade se obtém com a distribuição dos trabalhos, com a participação e com a troca de idéias.
Muitos desses, com o passar do tempo, afastados, numa poltrona, esquecidos, têm consciência de que nada fizeram, não construíram sua subjetividade e vegetam. Quando instados, não sabem de outra coisa que não seja falar de seu passado na empresa – um assunto aborrecido porque ele ficou e a empresa avançou de um modo ou outro...sem eles.




Cuidem, por sua vez os intelectuais e os ditos sábios para não demonstrem ser “os donos da verdade”. Posicionarem-se no pedestal de estátuas. Moderação, moderação faz bem!





Por conta dessas impressões, neste Temas já publiquei e republiquei a história “Reavaliações e renúncias” em 10.10.2010 da qual transcrevo este trecho de ex-executivo que preferiu renunciar a esse mundo, o mundo da soberba. Muitos são os que conseguem:

- Mas, o que parece certo é que a soberba é mais agressiva, mais ambiciosa, assustadora e predomina no mundo. Eu sei disso porque convivi nesse mundo de competição e posso dizer que combati a soberba com a soberba. Mas, os tempos mudaram. Sendo a soberba uma não virtude ela tende a manter as desigualdades subestimando ou minimizando as virtudes do respeito ao próximo, da honestidade, da lealdade, do altruísmo. A modéstia contrapõe-se à arrogância e à violência. Proponho, pois, um mundo "modesto"? Uma utopia? Trazer o céu para a terra? Não é bem isso. Seria uma impossibilidade. Sabemos que nosso mundo é naturalmente o mundo das desigualdades. Com ela, a modéstia, cultivada numa permanente autocrítica do indivíduo, possivelmente fizéssemos o mundo apenas um pouco menos desigual, um pouco menos doente. Com mais amor, mais amizade, mais lealdade, mais altruísmo.
Imagens

(1) Gravura de Karel van Mallery (1571/1635). Fonte: www.baciadasalmas.com
(2) Gooogle (gravura repetida em outros blogs)
(3) idem


ESPECIAL

Piano: Silvio Pimentel Martins

Tema: Ernesto Nazareth, "Brejeiro"

03/07/2011

POEMAS, para não dizer que não falei de... (V)

(Estas composições são de diferentes épocas, lembrando que algumas ou todas já ilustraram crônicas neste Temas – agora nestas resenhas eu as tenho recuperado e compilado).


IMPOTÊNCIAS


Sereno, medito neste meu canto
Uma avenca aos trinta anos me encara
Orquídeas sorriem e olhinhos delicados
Miram violetas roxas com ternura e encanto,

Estanco surpreso com essa beleza
As multicores irradiadas à tépida luz
Nem mais haveria, porque elas exultam
Nesta plaga de recolhimento e singeleza.

Não me constrangeria se ali caísse em oração
Agradecido por aquelas existências reais
Sorrisos doces em oferendas, momentos de paz
Nestes tempos doentes, de guerras e destruição,

Transporto-me então para outra realidade, dura
Lá, tombam árvores, queimam-se florestas
O fogo desencadeia indescritível tragédia
Ceifando tudo, a vida, os bichos, a doçura

Exala de mim amarga tristeza e dor
Por clamar em silêncio, sem ouvidos
Ameaço gritar aos quatro ventos
Mas os sons se perdem em obscuro torpor,

Não reconheço esses ventos maculados
Sopram eles espíritos de tormentas assistidas
Neste fogaréu imenso de provações
Insensibilidades, ódios e odores desregrados,

Saberiam todos que este solo esgotado
Não haverá por muito como se refazer desses abusos
Apontando em riste e em lágrimas secas
Que pouco sobrará destes tempos abusados?

Resigno-me à minha impotência já tanto esquecido
Perante minhas poucas orquídeas, violetas e avencas
Intuindo no íntimo com angústia e melancolia
Que fenecem os tempos neste clima embrutecido.


COQUEIRO QUE DÁ COCO


Meu querido amigo coqueiro
Que plantei como anão
Hoje bate nas nuvens
Complicando a colheita aqui do chão
Você quebra as telhas
Engrossa o tronco gigante,
Assim, meu caro amigo
Que cultivei, vi crescer e cocar
Ficarei com você até não sei
Não pelos cocos às dezenas que devolve
Mas, a sua doçura líquida que me comove.



ANTIGA-IDADE, Antiguidade

Caminho olhando pra frente
Firme, busco compreensão sentida,
Dessa coisa que sacode ardente
Dessa centelha frágil chamada vida!

Mas, o que é isso tudo, afinal
Se a cada momento dado, há impostas
barreiras, desafios, sem prévio sinal?
Remexendo interiores, sem respostas?

Olho ansioso para o alto, então
Ouço a voz universal, tênue e piedosa
Sinto-me entre as estrelas, em solidão
Nada sei dessas luzes silenciosas!

Volto-me para mim, miro-me n’alma
Medito no todo dessa realidade (?)
Insisto em desvendar a centelha calma
Mas, apenas intuo que já vivo antiga-idade...


As outras compilações serão encontradas neste Temas nas datas seguintes com os respectivos títulos:

I – 09.01.2011
Ondas de vida
És jovem sessentão
Poeta beberrão
Presente, passado e futuro
Paixões

II – 31.01.2011
Orquídeas e beija-flores
Passado-presente
Antigo sim, velho jamais

III – 13.03.2011
Etéreos
Contradições e silêncio
Entardeceres

IV – 16.05.2011
Templo violado
Nu artístico
A noite


NOTAS

Inclui nas resenhas constantes do título “Dos livros que não consegui (ainda?) ler. E os já lidos” de 17.10.2010 comentários sobre o livro “O Presidente negro” de Monteiro Lobato.

Para lembrar: na crônica de 28.03.2010 comento e comparo duas obras importantes: “Madame Bovary e Anna Karenina. Duas personagens”, respectivamente de Flaubert e Tolstoi.


Imagens / fotos:

(1) pedranocaminho.blogspot.com
(2) Milton Pimentel Martins do coqueiro que inspira o poema
(3) Google

19/06/2011

AQUELES QUE RENUNCIAM

O assunto que trato hoje nestes Temas, alerte-se, é meio tabu ou por outra, não tem aquele final no qual implicitamente há uma moral, como a “a moral da história”. O desenvolvimento se inspira em fatos. Faz parte das minhas andanças por esses caminhos retos ou tortuosos.
Quero avisar que, depois de mais de uma centena de composições aqui publicadas, nem sei se há muito ineditismo ou repetições nesta. Lugar comum? Obviedades? Não sei.


1.
Certa vez, a um materialista / ateu absolutamente cético ou exibido, tendo diante de nós um corpo sem vida de um amigo comum, desafiei-o.
- Explique a diferença entre o Alcides deitado naquele caixão inerte e você aí de pé perplexo e emocionado. Considere que há uns dias, falávamos com ele no almoço. Hoje ele está lá, sem expressão, sem respiração, sem voz.
Ele apenas me olhou aborrecido e respondeu:
- É por isso que não acredito em nada. O que dizer daquela massa inerte que não durará muito para se decompor...

2.
É muito comum pessoas com alguma interioridade ao acordarem de um sono profundo, sentirem-se angustiados ao constatar que voltaram a ser regidas pela lei da gravidade, devendo carregar seu corpo denso, nesta morada meio sem sentido neste planeta tão desigual. Porque no sono, parece, a alma, o espírito ou o nome que se queira dar a essa luz que nos diferencia dos mortos, desliza no éter sem peso, com liberdade e com a velocidade do pensamento.
Quanto vezes, vi-me levitando num sono “real” e ainda por cima envaidecido por exibir esses meus “poderes”. No sonho!

3.
O retorno, pois, à luta terrena pode causar certo desconforto, mas há que lutar porque há uma música religiosa que proclama que “a vida é luta sem quartel”. Esse fenômeno que se verifica no momento em que se desperta, dá uma idéia entre a possível vida leve do outro lado e a vida densa deste lado, do lado que julgamos ter consciência de nós mesmos. De viver.

4.
São essas variáveis que nos fazem lutadores, felizes tantas vezes, esse sentimento que exulta e nos faz poetas. Mesmo que composições não ritmadas, sem rimadas e sequer escritas.

5.
Mas, há seres humanos que se fixam demais no peso da vida, no que ela pode ter de amargo, assumem a falta de perspectiva, que não absorvem seu limite ou que se sentem derrotados (assumem a condição de "perdedores", em oposição aos "vencedores", um conceito vazio no qual predominam os bens materiais nada a ver com as indagações profundas da vida e da individualidade de cada um). Ao acordarem, diariamente, se angustiam por mais aquele dia de vida consciente, tendo à sua frente menores desafios e mais amarguras sem causa que atormentam. A vida torna-se um fardo.

6.
A moça que conheci era inteligente, tinha boa postura profissional e cultura formal. Viajara diversas vezes para o Exterior.
Sua vida particular não fugia muito da média. Trabalhara em São Paulo, morando sozinha, visitava os pais quase que semanalmente e tinha bons amigos. Demonstrava alguma devoção religiosa, assistindo, normalmente, missa dominical.
No seu relacionamento profissional cotidiano, porém, mostrava-se insegura. Insistia em lembrar os tempos em que fizera teatro amador. Dai seus gestos teatrais, sua entonação de voz.
Somente depois de algum tempo, começou a se descontrair, embora, com alguma regularidade, revelasse momentos depressivos, um estado que não se afastava muito de qualquer um de nós.
Certo dia, imaginando que bem me situava na vida profissional me perguntou:
- O que você está fazendo aqui, essa perda de tempo?

7.
Certo dia, soube que ela resolvera mudar sua vida profissional. Aceitara proposta de trabalho de volta em São Paulo que possibilitaria um convívio num outro ambiente mais "inteligente" no qual se dera melhor no passado.
Tempos depois, por razões de mercado de trabalho, fora ela demitida. Ficara desempregada, frustrando todas suas expectativas.

8.

Meses mais tarde, nas vésperas das festas de fim de ano, período em que a solidão bate forte porque o espírito natalino pode não ser apreendido por aqueles angustiados, tomando um velho revólver esquecido, carregado parcialmente, mirou-o contra o próprio peito, apertando o gatilho.
O tiro fora fatal. Atingira o coração. Nos segundos que se seguiram até sua morte, às pessoas que vieram em seu socorro, disse tenuemente que se arrependera e de que não queria morrer.
Apenas um momento de irreflexão, conduziu-a a um caminho sem volta.

9.
Tal gesto, mesmo que num momento de amargura e dor, exige uma imensa coragem e renúncia porque a viagem ao desconhecido tivera a hora antecipada e, sobretudo, uma atitude antiautopreservação.
O instinto de defesa é anulado, sobrepondo-se o sonho e a esperança da leveza e do encontro com divindades, num mundo no mínimo não tão denso e amargo como o seu. Por ruim que fosse, certamente seria melhor do que a vida vivida.

10.
Nesses casos, sempre me pergunto: que tipo de vozes interiores ouve o suicida no exato momento em que age contra a própria vida? Que vozes tão eloquentes são essas que suplantam o instinto primário da preservação? Se, ao longo da vida, somos preparados para a morte natural, aí incluída a acidental, quais os efeitos do suicídio no exato momento da passagem para o outro lado da existência?

11.
Essas perguntas, ao longo do tempo, têm me afligido muito.
Para os que acreditarem na doutrina, as respostas podem ser encontradas na literatura espírita (especialmente o livro psicografado "Memórias de um suicida" *) e mesmo espiritualista. Todas elas concordam que o suicida atormentado, ao chegar nesse plano, passa pelas mais terríveis experiências, por imensa dor, pois que fugira da luta, abreviara sua estada voluntariamente, interrompera um ciclo de tarefas às vezes por motivos fúteis, incompreensíveis. Destruíra sua própria morada.

12.
Nesse plano, dizem os espiritualistas, a marca da renúncia à vida perdura por longo tempo até que volta o suicida a ser admitido numa escala menos atribulada de aprendizado. Esse gesto extremo, explicaria as grandes anomalias e doenças físicas de certas pessoas, que são submetidas à lei da causa e efeito na reencarnação seguinte.

13.
Na limitada compreensão que tenho (temos) da vida, tudo parece muito injusto e triste. A Lei de Talião aplicada. Mas, esses eventos não podem, ou não devem ser tomados nos limites de uma existência ou nos poucos anos de uma vida. Há uma transcendência que martela, martela e quanto a mim, me conduz a admitir a explicação da reencarnação. Porque, "com a morte, não se perde nada daquilo que a alma adquiriu. As experiências que o homem fez nas vidas passadas, tornam-se instintos e incitam-no ao progresso, até inconscientemente" (cf. "Bhagavad Gîtâ").

(*) “Memória de um suicida”, psicografada pela médium Yvonne do Amaral Pereira (Federação Espírita Brasileira).
Ver crônica de 03.04.2011 o pesadelo de local inóspito, embrutecido: "Alucinações, sonhos(?!)"

Imagem/ fonte: Sociologando.wordpress.com (Google)

ESPECIAL

J.C. Bach - Prelude III in C# Major Book I
Piano: Silvio Pimentel Martins